terça-feira, 24 de setembro de 2013

Mulheres que dançam pensando... ou o contrário

Tenho conversado bastante com algumas mulheres e percebi que todas temos falado um assunto em comum: o papel da mulher está sofrendo novamente uma mudança visível.Para além da mudança a nível mundial, com o fato de ter cada vez mais mulheres no mercado de trabalho, nas universidades e em importantes cargos do governo; há as mudanças locais, de cultura para cultura. E é essa a que interessa aqui, pois entendemos que é dela que sai a onda que se expande até atingir escalas maiores.O ponto mais tocado em todas as conversas foi o do relacionamento afetivo heterossexual. Entendemos que a estrutura do amor romântico - a la Romeu e Julieta, monogâmico, "até que a morte nos separe" está condenado a findar-se. Não é real mais. Não é mais possível. Alguns resistirão e passarão muito bem por isso. Mas estes serão, a partir daqui, a exceção e não a regra. Basta observar a natureza humana para perceber que é extremamente difícil passar toda uma vida com um ou dois parceiros somente. A tendência natural, veja bem, natural do ser-humano é a de se relacionar com mais pessoas. Independente da profundidade desta relação. O desejo animal, instintivo, sexual é inerente a todos nós. Isto é muito claro. Associamos esta mudança à sociedade moderna, que coloca a mulher outra vez em pé de igualdade com o homem, de forma que ela possa fazer suas escolhas sem precisar se expor, nem se sentir culpada, ao mesmo tempo em que as discussões a nível intelectual se equipararam a tal ponto que, não havendo a necessidade da discrição, omissão, ou não havendo o medo à exposição, a mulher entende porque toma cada decisão e sabe argumentá-la e defendê-la sem que isso seja percebido como um problema.Parece que nós mulheres estamos começando a entender o equilíbrio destas relações e parece que estamos entendendo o que é ser mulher - pelo menos enquanto gênero, o que significa dizer que a mulher é um ser que pensa nela e no outro, por natureza. Ela cuida e é dócil, amável. Em algumas isso vai sobressair mais, em outras menos. Mas o que dizemos aqui é que isso é uma característica inerente às mulheres. E, partindo disso, parece que estamos mais interessadas em compreender o universo masculino, saindo do papel das competidoras, para nos colocar no papel de observadoras de nós mesmas, antes de mais nada. Pois, ao compreender o universo masculino teremos mais chances de conviver de forma otimizada e harmônica - primeiro conosco - depois com eles. Não se trata, porém, de considerar a mulher melhor ou mais importante que os homens. Se trata de perceber que ambos tem a importância dentro de uma sociedade. E que os papéis variam sim.Claro que a conversa é muito mais profunda e complexa que esta brevíssima introdução feita aqui. Resulta que por conta dessas prosas, decidimos fazer um trabalho onde descobriremos como nossos corpos falam o que nossas cabeças pensam. Que tipo de movimentação poderá sair daí? Não temos a menor ideia. Vamos mexer nas nossas histórias pessoais, de sucesso e de decepção com os homens do nosso passado. Vamos mexer nos nossos sentimentos e emoções mais profundos. Vamos mexer no nosso orgulho e nas feridas ainda em processo de cicatrização. Vamos investigar a fundo por onde passam todas as questões do relacionar-se com alguém. E não é porque alguém nos decepcionou ou nos fez felizes. Este grupo de mulheres entende que ninguém é responsável por um sentimento-emoção que está em mim. E se está em mim, somente eu posso senti-lo, ativando-o o quanto e quando dou conta.É um trabalho de auto pesquisa que se baseia na auto-responsabilização. O outro é puro cenário. É pura ilusão.



     (Priscila Patta coordenando o ensaio da Cia Khalua noespetáculo Delirium, de Thalita Menezes e Leandro Brito, em 2012, na cidade de BH/MG)
           


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3 comentários:

Janice Pires disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Janice Pires disse...

Adorei a reflexão! Penso que a sexualidade feminina ainda caminha no passo do conhecimento do ser "masculino", este em evolução nos homens e em nós mesmas. Por tempos a fio nos adaptamos à masculinidade que rege a sociedade consumista contemporânea e acho que este comportamento do "consumo" inevitável à sobrevivência atual, acabou por tornar-se visível no modo com o qual os homens realcionam-se coma as mulheres e consigo mesmo. Acredito que mais do que conhecer o outro, estamos reaprendendo a conhecer nós mesmas como um ser híbrido e complexo por natureza. Conhecer o "homem" tem sido até fácil. O que amedronta é quando descobrimos a nós mesmas e não sabemos onde encaixar esse "XX" no mundo de hoje. O corpo, assim como as relações gritam por liberdade e arte, a arte de se tocar, de tocar o outro, de dar um abraço antes de uma reunião e um bom dia com um sorriso sincero. O mundo do poder ainda é "masculino" e como me disse o psicólogo do meu filho, tem muita mulher "pintuda" por aí. Começo a perceber uma abertura para o poder do feminino, este da criação, da multidisciplinariedade(palavrinha difícil rs) de ações e de um olhar mais humano diante de uma democracia já falida.Sinto que nos responsabilizamos pelos sentimentos e vivências umas das outras como mulheres, como se o sentido de unidade das "tribos" voltasse a ser importante para as criações coletivas. Pensando nesta questão do corpo contemporâneo e na nossa cultura, ainda precisamos romper muitos padrões sociais. A moral estragou grande parte da nossa formação humana. Naõ podemos gritar, não podemos chorar na frente dos filhos, não podemos mastigar chiclete de boca aberta. E é por isso que fazemos arte. A arte é um mundo... um outro mundo. As mulheres que se atreveram no passado a serem quem eram acabaram loucas ou mortas, a citar Camille Claudel. Hoje chegamos só um pouquinho à beira da loucura. rs e ainda bem que tentamos. Penso que o ato de descobrir o próprio corpo passa pela barreira de enfrentar a moral e experimentar possibilidades até então não pensadas. Fico triste em pensar que muitas de nós descobrem o câncer de mama tardiamente porque não se tocam e não são tocadas. E o toque verdadeiro não é só prazer e nem só cuidado. É um misto das duas coisas. De prazer só,já basta a mídia. Sinto que ainda nos falta as duas vivências: a do prazer consigo mesmo e a do cuidado com o outro. É preciso permitir-se não ser uma "barbie" quando não se tem tempo de arrumar as unhas ou os pés estão com calos à vista; permitir-se usar aquele velho sutiã sem bojo que não encontramos mais nas lojas, permitir-se caminhar sobre o meio fio para testar seu equilíbrio de salto alto e rir... rir muito.. rir de qualquer coisa, inclusive do que não damos conta. beijos, Janice.

Priscila Patta (da cabeça aos pés) disse...

Janice, suas colocações são pertinentes. Quando você diz que "o que amedronta é quando descobrimos a nós mesmas", eu identifico aí o ponto da auto responsabilização. O capitalismo e essa tal de democracia que vivemos aqui no Brasil nos ensinaram que devemos perceber o mundo de fora pra mais longe ainda. Fomos nos esquecendo de nós mesmos, enquanto seres humanos, que pensam (!), sentem (!!). Como diz Bertherat: “Nosso corpo somos nós. É nossa única realidade perceptível. Não se opõe a nossa inteligência, sentimentos, alma. Ele os inclui, dá-lhes abrigo. Por isso tomar consciência do próprio corpo é ter acesso ao ser inteiro… pois corpo e espírito, psíquico e físico, e até força e fraqueza , representam não a dualidade do ser, mas sua unidade.”
É tempo de olhar para a unidade, um pouco parecido com o que você diz do resgate das tribos. Muito grata por você se fazer presente! VAMOS JUNTOS!